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Fraturas Distais da Clavícula

Ombro e Braço

O que é?

As fraturas distais da clavícula são lesões traumáticas, geralmente causadas por trauma direto no ombro, normalmente em resultado de uma queda em adultos.

O diagnóstico é confirmado com radiografias padrão do ombro e uma vista com inclinação cefálica de 15° (vista de Zanca).

O tratamento pode ser conservador (imobilização) ou cirúrgico, dependendo do grau de desvio e da estabilidade da clavícula distal, determinado pela integridade dos ligamentos coracoclaviculares (ligamentos trapezoide e conoide).

Epidemiologia

Incidência:

Comum – As fraturas da clavícula representam 2,6 a 4% de todas as fraturas em adultos.

Demografia:

Mais frequente em pacientes idosos ou com osteoporose; menos comum em crianças.

Localização Anatómica:

10-25% das fraturas da clavícula ocorrem no terço distal.

Etiologia

Mecanismo:
  • Mecanismo semelhante ao das fraturas do terço médio da clavícula.
  • Geralmente ocorre após a aplicação de uma força compressiva direta sobre o ombro, como por exemplo após uma queda ou trauma.
Anatomia patológica:

O deslocamento da fratura corresponde a:

  • Localização da fratura (por exemplo, extra-articular vs. intra-articular)
  • Padrão da fratura (por exemplo, simples vs. cominutiva)
  • Integridade dos ligamentos coracoclaviculares
  • O ligamento conoide (medial) e o ligamento trapezoide (lateral) oferecem resistência primária ao deslocamento superior da extremidade lateral da clavícula.
  • Idade (por exemplo, em pacientes pediátricos, a bainha perióstica tende a manter-se intacta)
  • Forças deformantes envolvidas

Condições Associadas (raras)

  • Ombro flutuante

  • Dissociação escapulotorácica

  • Fraturas das costelas

  • Pneumotórax

  • Lesão neurovascular

Anatomia

Anatomia da articulação acromioclavicular (AC)
Estabilidade da articulação AC

Ligamento acromioclavicular (AC):
  • Proporciona estabilidade antero-posterior.

  • Insere-se a 6 mm do extremo distal da clavícula.

  • Composto por quatro porções:

    • Superior

    • Inferior

    • Anterior

    • Posterior

  • O ligamento superior é o mais forte, seguido do posterior.

Ligamentos coracoclaviculares (CC)trapezoide e conoide:
      • Responsáveis pela estabilidade superior/inferior.

      • Componentes:

        • Ligamento trapezoide (lateral):

          • Insere-se a 2-3 cm do extremo distal da clavícula.

          • Liga-se ao tubérculo trapezoide, situado anterolateralmente ao tubérculo conoide.

        • Ligamento conoide (medial):

          • Insere-se a 4-4,5 cm do extremo distal da clavícula, no bordo posterior.

          • Liga-se ao tubérculo conoide, localizado póstero-medialmente ao tubérculo trapezoide.

      • O ligamento conoide é o principal responsável pela estabilidade vertical.

    • Cápsula articular (envolve toda a articulação AC)

Estabilizadores dinâmicos:
  • Músculo deltoide
  • Músculo trapézio

Classificação de Neer

Classificação de Neer Descrição Estabilidade Tratamento
Tipo I Fratura extra-articular, lateral aos ligamentos coracoclaviculares (CC).
Ligamentos conoide e/ou trapezoide mantêm-se intactos.
Desvio mínimo.
Estável Não cirúrgico
Tipo IIA Fratura medial aos ligamentos CC.
Ligamentos conoide e trapezoide intactos.
Desvio significativo da clavícula medial.
Taxa de não consolidação até 56% com tratamento conservador.
Instável Cirúrgico
Tipo IIB Dois padrões possíveis:
(1) Fratura entre os ligamentos CC:
– Ligamento conoide rompido
– Ligamento trapezoide intacto
(2) Fratura lateral aos ligamentos CC:
– Ambos os ligamentos conoide e trapezoide rompidos
Desvio significativo da clavícula medial.
Taxa de não consolidação entre 30-45% com tratamento conservador.
Instável Cirúrgico
Tipo III Fratura intra-articular, lateral aos ligamentos CC, estendendo-se à articulação AC.
Ligamentos conoide e trapezoide mantêm-se intactos.
Desvio mínimo.
Pode evoluir para artrose pós-traumática da articulação AC.
Estável Não cirúrgico
Tipo IV Fratura fisária em pacientes imaturos esqueléticos.
Ligamentos conoide e trapezoide mantêm-se intactos.
A extremidade lateral da clavícula desloca-se superiormente por rutura do periósteo espesso (a clavícula “sai” da bainha perióstica).
Estável Não cirúrgico
Tipo V Fratura cominutiva.
Ligamentos conoide e trapezoide mantêm-se intactos.
Desvio significativo da clavícula medial.
Geralmente instável Cirúrgico
Type I
Type IIA
Type IIB
Type III
Type IV
Type V

Classificação AO

Classificação AO Subtipo Descrição Tratamento
Tipo A A1 Fratura extra-articular, sem desvio, com ligamentos coracoclaviculares (CC) intactos. Não cirúrgico
A2 Fratura intra-articular, sem desvio, com ligamentos CC intactos. Não cirúrgico
Tipo B B1 Fratura extra-articular, com desvio, com ligamentos CC intactos. Conservador ou cirúrgico
B2 Fratura cominutiva, com desvio, com ligamentos CC intactos. Conservador ou cirúrgico
Tipo C C1 Fratura extra-articular, com desvio, com rotura dos ligamentos CC. Cirúrgico
C2 Fratura intra-articular, com desvio, com rotura dos ligamentos CC. Cirúrgico

Apresentação Clínica

Sintomas
  • Dor na região anterior do ombro

Exame Físico
  • Edema (inchaço)

  • Equimose (manchas roxas devido a sangramento subcutâneo)

  • Sensibilidade à palpação

  • Deformidade na articulação acromioclavicular (AC)

  • Pode apresentar elevação da pele sobre a fratura (sinal de fratura exposta iminente)

  • Deve ser realizado um exame neurovascular cuidadoso

  • O nervo supraescapular está em risco de lesão
    Pode observar-se fraqueza na rotação externa com o braço em adução

Imagiologia

Radiografias
  • Projeções recomendadas:

    • Projeção AP (ântero-posterior) em posição ortostática dos dois ombros

    • Projeção axilar lateral

    • Projeção com inclinação cefálica de 15° (vista de Zanca)

      • Útil para avaliar o deslocamento superior/inferior da clavícula

  • Pode ser considerado pedir ao paciente para segurar um peso de 2 a 5 kg na mão do lado afetado, para acentuar o desvio na imagem

TAC (Tomografia Axial Computorizada)
  • Projeções:

    • Coronal

    • Sagital

    • Axial

    • Reconstruções em 3D

  • Achados possíveis:

    • Avaliação do desvio, encurtamento, cominuição, extensão articular e pseudoartrose

Diferencial

  • Fraturas da diáfise da clavícula

  • Lesão fisária medial da clavícula em idade pediátrica

  • Lesão fisária distal da clavícula em idade pediátrica

  • Separação acromioclavicular

Tratamento

Não cirúrgico
  • Imobilização com tipoia e exercícios suaves de amplitude de movimento (ADM) entre as 2-4 semanas, e reforço muscular entre as 6-10 semanas

  • Indicações:

    • Fraturas estáveis (Neer Tipo I, III, IV)

    • Fraturas distais da clavícula em crianças (imaturas do ponto de vista esquelético)

Cirúrgico
    • Redução aberta com fixação interna

    • Indicações:

      • Absolutas:

        • Fraturas expostas ou com risco iminente de exposição

        • Lesão da artéria ou veia subclávia

        • Ombro flutuante (fraturas da clavícula distal e colo da escápula com > 10 mm de desvio)

        • Pseudoartrose sintomática

      • Relativas:

        • Padrões de fratura instáveis (Neer Tipo IIA, IIB, V)

        • Lesão do plexo braquial (questionável, pois 66% têm recuperação espontânea)

        • Traumatismo craniano fechado

        • Epilepsia

        • Politraumatizado

Técnicas

Imobilização com Tipoia
  • Técnica:

    • Imobilizar utilizando uma tipoia ou uma ortótese em figura de oito

    • Estudos prospetivos não demonstraram diferença nos resultados funcionais ou estéticos entre a tipoia e a ortótese em figura de oito

    • Não deve ser feita qualquer tentativa de redução da fratura

    • Iniciar exercícios suaves de amplitude de movimento (ADM) após 2-4 semanas

    • Iniciar exercícios de reforço muscular entre as 6-10 semanas

  • Resultados:

    • Taxa de não consolidação (pseudoartrose) de aproximadamente 15%

  • Fatores de risco para não consolidação:

    • Grupo Neer II (até 56% de taxa de não união)

    • Ligamentos coracoclaviculares (CC) comprometidos

    • Idade avançada

    • Sexo feminino

    • Resultado estético insatisfatório

Técnicas

Redução Aberta com Fixação Interna (RAFI)
  • Placa de compressão dinâmica de contacto limitado

Posicionamento do paciente

  • Posição em cadeira de praia ou decúbito dorsal (supina)

Acesso cirúrgico

  • Abordagem superior à articulação acromioclavicular (AC)

Fixação temporária

  • Utilização de fios de Kirschner (K-wires)

Instrumentação

  • Placas bloqueadas (locking plates)
  • Placas anatómicas pré-moldadas

Técnica

      • É necessário um fragmento distal maior para permitir a colocação de vários parafusos bloqueados
      • Devem ser colocados mais de 3-4 parafusos bicorticais no fragmento medial para reduzir o risco de arrancamento dos parafusos

Técnicas

Placa em Gancho (Hook Plate)

Posição

  • Cadeira de praia ou decúbito dorsal (supina)

Acesso

  • Abordagem superior à articulação AC

Fixação temporária

  • Fios de Kirschner

Instrumentação

  • As placas em gancho variam em profundidade do gancho e número de orifícios

  • A profundidade adequada do gancho é essencial para evitar uma redução excessiva ou insuficiente da articulação AC

Técnica

  • As placas em gancho são geralmente utilizadas quando há osso insuficiente no fragmento distal para fixação com placas convencionais

  • O gancho deve ser colocado posteriormente à articulação AC e o mais lateral possível, para evitar a saída do gancho

  • Devem ser colocados mais de 3-4 parafusos bicorticais no fragmento proximal (medial) para reduzir o risco de soltura

Nota

  • A placa em gancho requer uma segunda cirurgia para remoção

Técnicas

Outras Opções
  • Fixação transarticular da articulação acromioclavicular (AC)

    • Geralmente utilizada como alternativa às placas em gancho

  • Fixação transacromial

  • Fio em banda de tensão (tension band wire)

  • Fixação com parafuso intramedular

Técnicas

Reconstrução/Reparação dos Ligamentos Coracoclaviculares

Procedimento de Weaver-Dunn Modificado
  • Utilizado principalmente para luxações da articulação AC

  • Também pode ser aplicado em fraturas distais da clavícula com fragmento facilmente ressecável e com possibilidade de transferência do ligamento coracoacromial (CA)

Vantagens

  • Maior taxa de consolidação óssea

  • Tempo mais rápido para união

  • Melhor resultado funcional e menor dor em atividades com o braço elevado

  • Menor taxa de malunião sintomática

  • Maior satisfação estética

Desvantagens

  • Maior risco de necessidade de procedimentos futuros (ex: remoção da placa em gancho)

  • Material de osteossíntese pode causar sintomas

  • Risco de infeção

Técnicas

Reabilitação Pós-operatória

Fase Inicial

  • Tipoia durante 7-10 dias, seguida de mobilização ativa

Fase Tardia

  • Início de exercícios de reforço muscular por volta das 6 semanas, quando houver mobilidade sem dor e sinais radiográficos de união óssea

  • Atividade completa, incluindo desportos, por volta dos 3 meses

  • Remoção do material cirúrgico geralmente considerada após os 3 meses

Complicações

Tratamento não cirúrgico
  • Pseudoartrose (~15%)

    • Fatores de risco:

      • Fratura cominutiva

      • Desvio significativo

      • Deformidade em “Z”

      • Sexo feminino

      • Idade avançada

      • Tabagismo

      • Fraturas do terço distal da clavícula mais propensas que as do terço médio

    • Tratamento:

      • Se assintomática: não é necessário tratamento

      • Se sintomática: realizar redução aberta com fixação interna (RAFI) com enxerto ósseo (particularmente em casos de pseudoartrose atrófica)

  • Artrose da articulação acromioclavicular (AC)

    • Fatores de risco:

      • Classificação de Neer Tipo I e III

    • Tratamento:

      • Resseção da clavícula distal

Tratamento cirúrgico
  • Proeminência do material de osteossíntese

    • Cerca de 30% dos pacientes solicitam remoção da placa

    • Placas colocadas na face superior da clavícula estão associadas a maior irritação

  • Remoção do material

    • Mais comum em placas em gancho

  • Lesão neurovascular (~3%)

    • Placas superiores associadas a maior risco de perfuração da artéria ou veia subclávia

  • Trombose da subclávia

  • Pseudoartrose (1-5%)

  • Infeção (~4,8%)

  • Falha mecânica (~1,4%)

  • Pneumotórax

  • Capsulite adesiva (ombro congelado)

    • Cerca de 4% dos pacientes submetidos a cirurgia desenvolvem capsulite adesiva, requerendo intervenção cirúrgica

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